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quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

JORNAL COMENTADO 39


TonY PacHecO*

6:32 – 17.01.2013 – Quinta-feira

“TODOS À COLINA”
(Tribuna da Bahia)

Sou mineiro, mas minha alma baiana se emociona com o Senhor do Bonfim, a multidão e o mar da Baía de Todos os Santos ao fundo

Foi-se o tempo em que os jornais impressos baianos tinham a baianidade na veia. Hoje, dia da Lavagem do Bonfim/Oxalá (êpa Babá!), nossa segunda maior manifestação popular, depois do Carnaval, somente a “Tribuna” resolveu dar na capa a manchete principal com o evento. Parabéns ao editor Paulo Roberto Sampaio por manter acesa a chama da baianidade.
Aliás, ao chegar à Bahia, a maior diferença que notei em relação às minhas Minas Gerais de nascimento, era justamente o “ethos cultural” da gente baiana. Todos orgulhosos de suas tradições, de suas festas.
Logo nos primeiros anos aqui, fui apresentado a um calendário enorme de eventos populares que em minha terra não havia. Cheguei em novembro e logo depois participei do Caruru de Santa Bárbara/Yansan (eparrei Oyá!), que tomava todo o Centro Histórico, principalmente a Baixa dos Sapateiros na região do Corpo de Bombeiros e nos mercados de Santa Bárbara e São Miguel. Esta festa, hoje em dia, é um quase nada e ano passado nem o caruru “oficial” do Mercado de Santa Bárbara teve.
Apenas quatro dias depois, ia eu de novo pra rua com os amigos baianos, desta vez pra conhecer a  Festa da Conceição, como era chamada a festa de Nossa Senhora da Conceição da Praia, comemorada em 8 de dezembro. Era tanta gente, tanta gente como na Lavagem do Bonfim. As barracas de comidas e bebidas se espalhavam da altura de onde hoje é o Trapiche Adelaide até as ruas internas do bairro do Comércio, tudo aos pés do Elevador Lacerda, marco abandonado de Salvador. Batucadas e muito samba davam a tônica da festa. Fiquei encantado quando antes de descer para a muvuca, olhei a multidão do mirante ao lado do Elevador, que na época não tinha ainda o modernoso prédio de vidro e ferro. Ali era uma praça. Hoje em dia, esta festa praticamente desapareceu.
E logo após, lá vou eu para a região da parte baixa do Plano Inclinado do Pilar, para tomar todas na Festa de Santa Luzia, um pouco menor, mas não menos animada, também na área do Comércio.
E no final do mês, veio o meu primeiro réveillon baiano, totalmente diferente de Minas, com todo mundo nas praias, jogando oferendas para Yemanjá e pedindo sorte no ano-novo. Eu levei logo umas rosas brancas e, realmente, tive sorte em todos os anos-novos seguintes. Nos réveillons de salão, também ao contrário de Minas, só gente sem graça. Nas praias é que fervia a festa da virada do ano, como ainda é hoje em Copacabana, no Rio, para onde mudou Yemanjá na virada do ano...
E no dia primeiro de janeiro, já estava eu numa barraquinha no Largo da Boa Viagem vendo a procissão marítima do Senhor Bom Jesus dos Navegantes liderada pela galeota "Gratidão do Povo". Hoje é apenas uma sombra do que foi...
E seis dias depois, estava eu na Festa da Lapinha, realizada no bairro de mesmo nome, junto da Liberdade e que era enorme. Tinha gente de toda a cidade e tomava os largos da Lapinha e Soledade, além das ruas internas, como na casa de Linda, Carlinhos e Marcelinho. Hoje em dia, passa quase despercebida.
Seguiu-se à apresentação oficial à Lavagem do Bonfim, apenas pouco mais de uma semana depois da Lapinha. Fiquei, de novo, extasiado. Numa tinha visto aquele mar de gente e mar de jegue. Sim, fiquei emocionado ao ver as carroças com os jegues enfeitados, que deram origem à expressão tipicamente baiana de sempre que vemos uma mulher ou homem bem vestido demais, logo dizemos: “Mais enfeitado do que jegue na Lavagem do Bonfim”. A Justiça baiana, que, como sabemos, é RÁPIDA E VOLTADA PARA OS INTERESSES DO POVO, proibiu há alguns anos os jegues na Lavagem, tirando um dos elementos de beleza da festa, para desespero de minha amiga e jornalista Sônia Araújo, que ganhou vários prêmios no concurso-de-enfeita-jegue-e-carroça. No último ano que o MERETÍSSIMO permitiu, Sônia estava esfuziante com seu companheiro e nosso amigo o coronel Humberto sempre ao lado. Era o dia em que todos os amigos se encontravam, pois todo mundo queimava o trabalho (eu, na época, trabalhando já no Banco Real na carteira de empréstimos, faltei sem pestanejar ao batente na Rua dos Ourives) pra participar da Lavagem. Ao final de janeiro, fui levado à Festa da Pituba, no entorno da Praça de Nossa Senhora da Luz, e fiquei encantado com o bairro todo traçado em quadras, ao contrário do resto de Salvador e aí descobri que o bairro da Pituba era planejado porque foi o mineiro Manoel Dias da Silva que o tinha idealizado. “Tava expricado”. Quem vibrava com a festa (principalmente com a parte religiosa, era o saudoso amigo e jornalista José Curvello, membro da Paróquia de Nossa Senhora da Luz). Hoje em dia esta festa acabou.
Dois dias após, fui apresentado à Festa de Yemanjá (odô Iyá!), no Rio Vermelho, com data fixa de 2 de fevereiro. Um mar de gente indo levar presentes para a Rainha do Mar, a deusa Yemanjá, na única festa que homenageia um deus africano sem sincretizá-lo com um católico. Dezenas e dezenas de embarcações cheias de balaios de flores, perfumes e todo tipo de presentes. Lembro-me que num ano, o jornalista André Curvello “capitaneou” a escuna dos jornalistas que acompanharam o lançamento da Marina da Contorno, que estava em construção. Foi uma festa magnífica no barco, mas ao chegar ao Largo da Mariquita, Alex Ferraz e eu pedimos licença a André Curvello e "gritamos um canoeiro" que passava com seu barquinho pra que ele nos levasse à muvuca. E foi o que fizemos e nunca nos arrependemos. Esta festa, embora um PREFEITO ou um MERITÍSSIMO, não me lembro bem, tenha proibido carros de som (eles são tão preocupados com nossos ouvidos... eu fico comovido...), continua sendo magnífica, embora negociantes da alegria popular insistam em querer transformá-la em coisa fechada. Espero que não consigam.
E, finalmente, na véspera do maior Carnaval do Brasil (ou segundo maior, segundo o povo de Recife/Olinda...), fui tomar todas e “chupar caranguejo” na Festa de Itapoan, um verdadeiro pré-Carnaval, com blocos nas ruas do bairro, tomando tudo, de Placafor até o Abaeté. Esta, quem me apresentou foi meu compadre (sou padrinho da filha dele, a doce Renatinha) Renato, da PM. Estávamos um grupo enorme, misturando PMs e jornalistas, num convívio que já não se vê mais...
Hoje, mais ou menos fortes ainda, só a Lavagem do Bonfim e a Festa de Yemanjá e coloco a culpa disso nos meus próprios coleguinhas jornalistas. Enquanto estive nas redações, via meus mestres como Jorge Calmon, Cruz Rios, João Ubaldo Ribeiro, Reynivaldo Britto, Eliezer Varjão e outros, sempre dando ênfase a estas manifestações populares. Depois, veio uma rapaziada que não quer nem saber de cheiro de povo, como o general Figueiredo, lembram dele?  Hoje, só chama a atenção quando é “rave”, “sertanejo universitário”, tudo em espaços lacrados onde o povão não entra e onde, claro, a alegria verdadeira também corre a léguas de distância, parecendo bloco chic-e-chato do Carnaval.
E vamos com a “Tribuna” aproveitar o que resta do Bonfim, já que os outros dois jornais nem se deram ao trabalho de abrir manchete com a festa. Mas Senhor do Bonfim é generoso demais e não vai negar a eles sua bênção!

* tony pacheco é do Sul de Minas, mas não saberia viver sem as bênçãos de Oxalá hoje em dia.

Um comentário:

  1. Que lindo Tony. Imprimi seu texto e distribuí com meus alunos aqui em Lauro.

    Josélia Soutto

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