TonY PacHecO*
6:32 – 17.01.2013
– Quinta-feira
“TODOS À COLINA”
(Tribuna da
Bahia)
Sou mineiro, mas minha alma baiana se emociona com o Senhor do Bonfim, a multidão e o mar da Baía de Todos os Santos ao fundo
Foi-se o
tempo em que os jornais impressos baianos tinham a baianidade na veia. Hoje,
dia da Lavagem do Bonfim/Oxalá (êpa Babá!), nossa segunda maior manifestação popular, depois do
Carnaval, somente a “Tribuna” resolveu dar na capa a manchete principal com o
evento. Parabéns ao editor Paulo Roberto Sampaio por manter acesa a chama da
baianidade.
Aliás, ao
chegar à Bahia, a maior diferença que notei em relação às minhas Minas Gerais de
nascimento, era justamente o “ethos cultural” da gente baiana. Todos orgulhosos
de suas tradições, de suas festas.
Logo nos
primeiros anos aqui, fui apresentado a um calendário enorme de eventos
populares que em minha terra não havia. Cheguei em novembro e logo depois
participei do Caruru de Santa Bárbara/Yansan (eparrei Oyá!), que tomava todo o Centro Histórico,
principalmente a Baixa dos Sapateiros na região do Corpo de Bombeiros e nos mercados
de Santa Bárbara e São Miguel. Esta festa, hoje em dia, é um quase nada e ano
passado nem o caruru “oficial” do Mercado de Santa Bárbara teve.
Apenas
quatro dias depois, ia eu de novo pra rua com os amigos baianos, desta vez pra
conhecer a Festa da Conceição, como era
chamada a festa de Nossa Senhora da Conceição da Praia, comemorada em 8 de
dezembro. Era tanta gente, tanta gente como na Lavagem do Bonfim. As barracas
de comidas e bebidas se espalhavam da altura de onde hoje é o Trapiche Adelaide
até as ruas internas do bairro do Comércio, tudo aos pés do Elevador Lacerda, marco abandonado de Salvador. Batucadas e muito samba davam a tônica
da festa. Fiquei encantado quando antes de descer para a muvuca, olhei a multidão
do mirante ao lado do Elevador, que na época não tinha ainda o
modernoso prédio de vidro e ferro. Ali era uma praça. Hoje em dia, esta festa
praticamente desapareceu.
E logo após,
lá vou eu para a região da parte baixa do Plano Inclinado do Pilar, para tomar
todas na Festa de Santa Luzia, um pouco menor, mas não menos animada, também na
área do Comércio.
E no final
do mês, veio o meu primeiro réveillon baiano, totalmente diferente de Minas,
com todo mundo nas praias, jogando oferendas para Yemanjá e pedindo sorte no
ano-novo. Eu levei logo umas rosas brancas e, realmente, tive sorte em todos os
anos-novos seguintes. Nos réveillons de salão, também ao contrário de Minas, só
gente sem graça. Nas praias é que fervia a festa da virada do ano, como ainda é hoje em Copacabana, no Rio, para onde mudou Yemanjá na virada do ano...
E no dia primeiro de janeiro, já estava eu numa barraquinha no Largo da Boa Viagem vendo a procissão marítima do Senhor Bom Jesus dos Navegantes liderada pela galeota "Gratidão do Povo". Hoje é apenas uma sombra do que foi...
E no dia primeiro de janeiro, já estava eu numa barraquinha no Largo da Boa Viagem vendo a procissão marítima do Senhor Bom Jesus dos Navegantes liderada pela galeota "Gratidão do Povo". Hoje é apenas uma sombra do que foi...
E seis dias
depois, estava eu na Festa da Lapinha, realizada no bairro de mesmo nome, junto
da Liberdade e que era enorme. Tinha gente de toda a cidade e tomava os largos
da Lapinha e Soledade, além das ruas internas, como na casa de Linda, Carlinhos e Marcelinho. Hoje em dia, passa quase
despercebida.
Seguiu-se à
apresentação oficial à Lavagem do Bonfim, apenas pouco mais de uma semana
depois da Lapinha. Fiquei, de novo, extasiado. Numa tinha visto aquele mar de gente e mar
de jegue. Sim, fiquei emocionado ao ver as carroças com os jegues enfeitados,
que deram origem à expressão tipicamente baiana de sempre que vemos uma mulher
ou homem bem vestido demais, logo dizemos: “Mais enfeitado do que jegue na
Lavagem do Bonfim”. A Justiça baiana, que, como sabemos, é RÁPIDA E VOLTADA
PARA OS INTERESSES DO POVO, proibiu há alguns anos os jegues na Lavagem,
tirando um dos elementos de beleza da festa, para desespero de minha amiga e
jornalista Sônia Araújo, que ganhou vários prêmios no concurso-de-enfeita-jegue-e-carroça. No último ano que o MERETÍSSIMO permitiu, Sônia estava esfuziante
com seu companheiro e nosso amigo o coronel Humberto sempre ao lado. Era o dia
em que todos os amigos se encontravam, pois todo mundo queimava o trabalho (eu,
na época, trabalhando já no Banco Real na carteira de empréstimos, faltei sem
pestanejar ao batente na Rua dos Ourives) pra participar da Lavagem. Ao final
de janeiro, fui levado à Festa da Pituba, no entorno da Praça de Nossa Senhora
da Luz, e fiquei encantado com o bairro todo traçado em quadras, ao contrário do
resto de Salvador e aí descobri que o bairro da Pituba era planejado porque foi
o mineiro Manoel Dias da Silva que o tinha idealizado. “Tava expricado”. Quem vibrava com a festa (principalmente com a parte religiosa, era o saudoso amigo e jornalista José Curvello, membro da Paróquia de Nossa Senhora da Luz). Hoje
em dia esta festa acabou.
Dois dias
após, fui apresentado à Festa de Yemanjá (odô Iyá!), no Rio Vermelho, com data fixa de 2
de fevereiro. Um mar de gente indo levar presentes para a Rainha do Mar, a
deusa Yemanjá, na única festa que homenageia um deus africano sem sincretizá-lo com um católico. Dezenas e dezenas de embarcações cheias de balaios de flores,
perfumes e todo tipo de presentes. Lembro-me que num ano, o jornalista André
Curvello “capitaneou” a escuna dos jornalistas que acompanharam o lançamento da
Marina da Contorno, que estava em construção. Foi uma festa magnífica no barco,
mas ao chegar ao Largo da Mariquita, Alex Ferraz e eu pedimos licença a André
Curvello e "gritamos um canoeiro" que passava com seu barquinho pra que ele nos
levasse à muvuca. E foi o que fizemos e nunca nos arrependemos. Esta festa,
embora um PREFEITO ou um MERITÍSSIMO, não me lembro bem, tenha proibido carros
de som (eles são tão preocupados com nossos ouvidos... eu fico comovido...),
continua sendo magnífica, embora negociantes da alegria popular insistam em
querer transformá-la em coisa fechada. Espero que não consigam.
E,
finalmente, na véspera do maior Carnaval do Brasil (ou segundo maior, segundo o
povo de Recife/Olinda...), fui tomar todas e “chupar caranguejo” na Festa de
Itapoan, um verdadeiro pré-Carnaval, com blocos nas ruas do bairro, tomando
tudo, de Placafor até o Abaeté. Esta, quem me apresentou foi meu compadre (sou
padrinho da filha dele, a doce Renatinha) Renato, da PM. Estávamos um grupo enorme,
misturando PMs e jornalistas, num convívio que já não se vê mais...
Hoje, mais ou menos fortes ainda, só a Lavagem do Bonfim e a Festa de Yemanjá e coloco a culpa
disso nos meus próprios coleguinhas jornalistas. Enquanto estive nas redações,
via meus mestres como Jorge Calmon, Cruz Rios, João Ubaldo Ribeiro, Reynivaldo
Britto, Eliezer Varjão e outros, sempre dando ênfase a estas manifestações
populares. Depois, veio uma rapaziada que não quer nem saber de cheiro de povo,
como o general Figueiredo, lembram dele? Hoje, só chama a atenção quando é “rave”, “sertanejo
universitário”, tudo em espaços lacrados onde o povão não entra e onde, claro,
a alegria verdadeira também corre a léguas de distância, parecendo bloco chic-e-chato do Carnaval.
E vamos com
a “Tribuna” aproveitar o que resta do Bonfim, já que os outros dois jornais nem
se deram ao trabalho de abrir manchete com a festa. Mas Senhor do Bonfim é
generoso demais e não vai negar a eles sua bênção!
* tony pacheco é do Sul de Minas, mas não saberia viver sem as bênçãos de Oxalá hoje em dia.
Que lindo Tony. Imprimi seu texto e distribuí com meus alunos aqui em Lauro.
ResponderExcluirJosélia Soutto