Filmes Comentários

sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

O que nos faz rir, para não chorar.

Ricardo Líper

Tudo aqui é feito na base da comédia. Estou falando de Salvador, nosso inferno superior ao de Dante. Aceito que você me diga:  por que não foi ainda embora? Eu mesmo me pergunto todo dia isso. Acho um lugar destruído com um povo sofrido, miserável em tudo, sendo espezinhado por todos, dos mais metidos a isso e aquilo até os que nada sabem de nada,  só sabem de sofrer, no que somos campeões. Não saio dessa infeliz cidade porque não posso ainda. Trabalho aqui e aí não tem jeito. Tenho de ficar, tentar sobreviver  e "guentar", mas não deixo barato, eu critico para devolver um pouco do incômodo que todos fazem contra todos. Não é só o desgoverno generalizado deste país comédia. Todos se torturam ou porque querem ou porque são como são no sentido de relações de poder de Foucault. 
Comecemos: tem um partido que tem como meta principal eleger o opositor. Já fez, recentemente, e fará até sair totalmente do poder. Não é consciente ou é esse projeto. Apenas fazem. Não sei. O ser humano nem Freud explica. Eu iria fazer campanha para a eleição de Gabrielli para o governo desta pocilga. Não vou mais. Pena, não é? Não vai ocorrer mais. Vão eleger o opositor, de outros partidos. É quase certo isso. Não sou profeta, mas vi o que ocorreu há alguns meses. Ou já fez um ano?
Até os cinemas, que sempre nos distraem, porque nos tiram da realidade mórbida deste esgoto por algumas horas, virou um inferno. Os filmes são dublados, as pessoas levam crianças de braço que choram e berram durante o filme; se for de terror, pessoas metidas a engraçadas, nervosas e inconvenientes desde que nasceram (existem, nascem, para ser inconvenientes e perturbarem o próximo. É uma maneira de existir) fazem graça dizendo coisas, nas cenas de maior impacto e suspense, fazendo papel de palhaço ou de débeis mentais por um impulso natural do idiota. Bem, o cinema como sala, pelos menos aqui em Salvador, vai acabar em breve. Mas Deus existe, cada vez estou mais certo disso. Podemos ver em paz, na internet, na alternativa: as antenas via satélite. Tem um sistema alternativo de filmes tidos como cult aqui em Salvador. É outra tortura. Nunca você sabe o horário, a não ser que imprima ou telefone para confirmar o horário do filme. Eles mudam sistematicamente os horários. Chegará o dia que exibirão metade de um filme, entra outro e a outra metade será exibida depois.  É de morrer de rir. Ou você imprime e leva consigo e olha todo dia para não chegar lá e ser outro filme ou não vê. Tem um filme em eterna pré-estréia. Um homem no Lago. Entrou num dos cinemas desse circuito cult, sexta, sábado, domingo. Às 21 horas e outros minutos talvez nem sei ao certo porque é impossível gravar, em um cinema que só se vai de carro e o perigo de assalto é enorme porque fica deserto o entorno nesse horário e nesses dias.
Salvador, saiu de casa,  em geral, você vai ser assaltado. Chegou a um nível de comédia. Falindo tudo: assistência médica, por exemplo, vá procurar um médico a qualquer hora, mesmo com planos de saúde caríssimos, uma emergência. Você e acompanhantes ficarão nas cadeiras horas e horas noite a dentro. A dengue voltou. Surtos de gripe permanentes.
O baiano é o povo que mais tosse no mundo, repare. Nos cinemas, nos teatros, nas filas, nos ônibus. Todo mundo tussindo. Nada funciona, a não ser impostos, multas, desabamentos, árvores caindo no Dique atrás daquela monstruosidade chamada Arena, que engarrafa tudo, que tranca ruas em volta, que leva ao desespero os moradores em volta dela, enfim, o diabo está deprimido porque superamos em maldade, irresponsabilidade, esculhambação, o Inferno. Quis se mudar para cá,  mas  não aguentou,  se deprimiu. Nós somos muito piores. Não me aborreço mais com nada. Só faço dar risada. Quando ligo a televisão e vejo o que dizem, mentindo sobre o que estão fazendo, dou gargalhada até chorar de tanto rir. Um filme, eternamente em pré-estréia, ri tanto que, quando for morar em outro lugar que não está acabando como Salvador, vou precisar levar uns vídeos daqui para rir lá.
Aliás, a velha Seleções do Reader´s Digest não dizia que rir é o melhor remédio? 

2 comentários:

  1. Vocês dos "Inimigos do Rei" são estrangeiros no Brasil; e olha que nem todo estrangeiro se sente tão mal assim aqui.

    Acredito que a causa deste mal-estar se deve ao fato de vocês não lerem a história de nosso país, só lerem livros de autores estrangeiros e sobre assuntos desvinculados com a realidade brasileira, a prova é que as postagens quase nada têm da história do país, em uma total desvinculação com as lutas por um país melhor, nota-se a insegurança quando o assunto é história do Brasil. Não esqueçam o que disse Agnes Heller: "A substância da sociedade é a história."

    Além do mal-estar provocado pela dose de estupefaciente fornecida pela mídia, para "seu" Pacheco este sintoma é sinônimo de superioridade, inteligência e cultura. Personagens são símbolos. Na telenovela "Roque Santeiro" existia um intelectual - professor e poeta incompreendido, de fala arrevesada, o professor Astromar, esquisitão, vira lobisomem -, que é como Dias Gomes simbolizava a intelectualidade brasileira média professores universitários, poetas desconhecidos, escribas de jornais desconhecidos do povo.

    Estes lobisomens da sociedade brasileira como almas penadas vivem em um mundo de dor e impotência. Alienados, incompreendidos e sem compreender o meio em que vivem e sem se auto-examinarem, verdadeiros lobisomens, estes intelectuais dos estratos médios maldizem a sorte e o mundo, inoculados pelo vírus da impotência nada fazem para modificá-lo, sendo a primeira delas conhecê-lo melhor.

    É curiosa esta situação: sujeitos estrangeiros no próprio país. A mídia golpista tem sua parcela de culpa nisto pois fornece a dose de insumo alienante diária que dopa até elefante.

    Como todos nós bombardeados pelas mensagens dos meios de comunicação serviçais de interesses estrangeiros estes viventes são mais facilmente vitimados pela melancolia e pelo mais nefasto niilismo pois vivem isolados no meio social. "Inimigos..." releiam o livro "O SUICÍDIO", de Émile Durkheim, pois a coisa é séria, a anomia deixa qualquer ser humano vulnerável.

    Em síntese, em sua faina de alienar e criar lobisomens, a mídia inimiga do povo brasileiro vende a imagem de que vivemos no pior país do mundo e que somos impotentes para mudá-lo, contudo, como acreditar em discos voadores, acredita quem quer...

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  2. excelente texto cara, descobrir seu Blog hoje e estou totalmente de acordo com o texto citado

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