Ricardo Líper
É curioso como a democracia teve de se estender a todas as camadas da sociedade e, como sugeriu, previu, percebeu Foucault, fez com que grupos oprimidos não esperassem pela revolução que supostamente os iria anistiar da opressão e reivindicassem seus direitos. Em pouco tempo, e estamos assistindo, se criou um fenômeno que vou chamar de Indiferentismo. Uma nova filosofia ou ideologia que já existe sem nome e consciência dos que já a praticam. Os negros conseguem cada vez mais limitar o racismo, os gays também a homofobia, a liberdade das mulheres avança cada vez mais e tudo em pouco tempo. Hoje, nos países democráticos, e não precisa ser a Holanda ou a Dinamarca, a diversidade das pessoas é muito respeitada e não se discrimina porque quem discrimina tem medo de ser discriminado por discriminar. Todo mundo só se preocupa em não passar por racista, homofóbico, contra as mulheres e outras coisas que constituem as conclusões do que seria humano, democrático e, portanto, politicamente correto. Para isso contribuíram dois grandes fatos. A queda das grandes ideologias antagônicas como o nazi-fascismo e o comunismo deixando o capitalismo democrático capaz de absorver e garantir as diversidades para poder manter a espinha dorsal do sistema capitalista ou assim pensar que poderia fazer isso. Portanto, tudo é permitido e respeitado. Gays podem casar, quem quiser muda de sexo, mulheres trocam de maridos, tudo é possível. Sim, existem alguns que ainda reagem, mas é assim mesmo que ocorrem com as mudanças sociais. O fato (e observe) é que, cada vez mais, a maioria das pessoas não está é ligando para nada, só se preocupam com elas. Mesmo os pais. Se o filho é gay, a filha já dá para os namorados, teve vários maridos como se fosse uma artista do cinema americano na década de 50 do século passado, cada vez mais pouco importa. Claro que não querem nada disso, mas enfim, ocorreu e foda-se o mundo. É o indiferentismo. Não é que aprove ou ame, mas ele é cordial e, em geral, só se é cordial com o que nos é indiferente. O profundo dessa nova postura filosófica ou ideológica é simples: já que tudo acabou, só estou interessado em ganhar dinheiro para fazer o que quero, me distrair e controlar meu colesterol. O resto foda-se, me é absolutamente indiferente. A mulher ou o marido, os filhos, os vizinhos, se são descasados, prostitutas, lésbicas, veados são tratados com respeito e nem se pensa nem se os olha, mesmo porque só se está interessado em ganhar dinheiro para o próximo churrasco de frango na laje de alguém com toda a fauna humana de evangélicos a travestis. O mesmo ocorreu com a antiga divisão de esquerda e direita. O que se percebe é que o político hoje não tem mais ideologia, quer ganhar dinheiro apenas e nada mais. Alguns administram melhor ou pior não por serem de esquerda ou direita. Só dizem alguns slogans e apoiam o catecismo politicamente correto. As marchas públicas estão com os dias contados. Paradas gays vão gradativamente diminuindo porque é cada vez mais pouco o que têm para reivindicar e vira, em alguns países como o nosso, um carnaval, assim como as marchas protestantes. Chegará o dia em que muitos poderão se confundir com as datas e irem a uma delas e depois ficarão sem saber se foram mesmo para uma parada gay ou uma marcha para Jesus. Ninguém está ligando para nada. Não se acredita em mais nada seriamente, a não ser encher os bolsos para curtir a vida e o resto que seja doido o suficiente lá à sua maneira e não o incomode. Sim, maconha vai ser liberada, agora repare, ninguém ama ninguém, só convive sem oprimir. Mas, peraí, você quer além disso, amor? Aí não dá. Ninguém aceita os outros no fundo da alma. Apenas para sobreviver melhor finge que aceita. Na realidade os indiferentes atuais, adeptos da filosofia do indeferentismo, só enxergam a si mesmo e seus semelhantes de comportamento sem os amá-los e muito menos os divergentes. O bolso cheio, colesterol controlado é o paraíso, pouco importa se o filho, o vizinho, o pai, depois de velho, viraram gays, maconheiros, tiveram várias mulheres. E, se eles têm dinheiro, melhor ainda e aí pode se dar até, mesmo por interesse, um grande abraço no seu aniversário. No caso dos gays, chamá-los de veados nunca mais e só dizem essa palavra quando estão bêbados, ou quando os próprios não estão presentes, ou ainda com a mulher, quando, depois da farra, estão a sós, se preparando para dormir. Aí ele pode substituir a expressão o outro veado se referindo ao companheiro do filho por genro, e os irmãos do filho podem também substituir o de o outro veado por cunhado o que os gays, quase sempre sofrendo de carência afetiva e, portanto, querendo ser aceitos como um casal equivalente de fato, gostam muito.